O quadrinho Escuta, Formosa Márcia, do brasileiro Marcello Quintanilha, foi premiado com o Gato de Ouro de melhor álbum do Festival de Angoulême de 2022, considerado uma espécie de "Cannes dos quadrinhos", no último sábado (19). Outro trabalho de Quintanilha, Tungstênio, já havia sido premiado no mesmo evento, em 2014 (quatro anos antes de virar filme, adaptado por Heitor Dhalia), mas dessa vez ele levou o prêmio máximo do evento.
Moradora de uma comunidade periférica do Rio de Janeiro, a enfermeira Márcia levanta-se às seis da manhã, beija o marido, Aluísio, e vai para o serviço, mas com a cabeça em sua filha adolescente, Jaqueline. Sua incapacidade de estabelecer harmonia na relação com a jovem, que passa a ser enredada nas engrenagens do crime organizado, vira o motor de Escuta, Formosa Márcia, lançada aqui pela Veneta e classificada na Europa como a mais ousada experiência narrativa do artista gráfico.
Nos conflitos que mobilizam a narrativa, o principal obstáculo a ser transposto por sua personagem central é frear os ímpetos da filha. Jaqueline não aceita se submeter a nada que a impeça de sair por aí e fazer o que quiser, sem dar satisfação a ninguém. Porém, quando a moça se enrosca com criminosas, Márcia vai chegar às últimas consequências para livrá-la do perigo. Quer Jaqueline queira, quer não.
"Em certa medida, Escuta, Formosa Márcia trata dos desdobramentos sociais e políticos a que nefastas escolhas das administrações públicas conduziram uma imensa parcela da população", afirma Quintanilha, que falou de seu passado pessoal em Luzes de Niterói, lançado em 2019.
Resultado de uma experiência alquímica que envolvia gibis, discos e um projetor de filmes valvulado. Jornalista do Norte que invadiu o Sudeste para fazer e escrever filmes.